sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Sobre lobos e cordeiros ou a democracia do Cuidar

Fábulas La Fontaine: tradução e adaptação: Ferreira Gullar



Na água limpa de um regato,
matava a sede um cordeiro,
quando, saindo do mato,
veio um lobo carniceiro.

Tinha a barriga vazia,
não comera o dia inteiro.
- Como tu ousas sujar
a água que estou bebendo?
- rosnou o Lobo a antegozar
o almoço. – Fica sabendo
que caro vais me pagar!

- Senhor – falou o Cordeiro -
encareço à Vossa Alteza
que me desculpeis mas acho
que vos enganais: bebendo,
quase dez braças abaixo
de vós, nesta correnteza,
não posso sujar-vos a água.

- Não importa. Guardo mágoa
de ti, que ano passado,
me destrataste, fingido!

- Mas eu nem tinha nascido.

- Pois então foi teu irmão.

- Não tenho irmão, Excelência.

- Chega de argumentação.
Estou perdendo a paciência!

- Não vos zangueis, desculpai!

- Não foi teu irmão? Foi o teu pai
ou senão foi teu avô.
Disse o Lobo carniceiro.
E ao Cordeiro devorou.

Moral : Onde a lei não existe, ao que parece, a razão do mais forte prevalece

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Para a categoria pensar:

O destino da democracia se decide no momento da sua fundação. Se os lobos são eleitos para estabelecer as regras do jogo, será inútil que as ovelhas que os elegeram berrem depois ao serem transformadas em churrasco. Pois os lobos, que elas elegeram como seus representantes para fazer as leis, escreveram como lei: “É direito dos lobos comer ovelhas”. Não existe caso em que os lobos tenha, democraticamente, aberto mão dos direitos que eles mesmos estabeleceram. As ovelhas são as culpadas de sua desgraça. Foram elas que, pelo voto, deram poder aos lobos.

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